Sistema de proteção por teleassistência
Na prossecução dos objetivos integrantes do Plano Nacional para a Igualdade de Género, Cidadania e Não Discriminação 2014/2017 (V PNI) que constituiu uma resposta à concretização dos princípios constitucionais da promoção da Igualdade e Não Discriminação.
Marta Silva dá-nos a conhecer o projeto “Implementação, do serviço de proteção por teleassistência a vítimas de violência doméstica”
1 – Pode fazer-nos uma Introdução/Enquadramento dos objetivos do projeto: “Implementação, do serviço de proteção por teleassistência a vítimas de violência doméstica”.
O combate à violência doméstica tem sido, do ponto de vista da política pública, uma das principais preocupações da sociedade portuguesa nos últimos anos.
Os sucessivos instrumentos de política pública de prevenção e combate à violência doméstica e de género - incluindo o atual Plano de Ação para a Prevenção e o Combate à Violência Contra Mulheres e à Violência Doméstica 2018-2021 (integrado na Estratégia Nacional para a Igualdade e a Não Discriminação 2018-2030 – Portugal + Igual, aprovada no passado dia 08 de março), têm-se fundamentado nos compromissos assumidos por Portugal nas várias instâncias internacionais, designadamente no âmbito da Organização das Nações Unidas, do Conselho da Europa, da União Europeia e da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa.
Entre esses compromissos destaque-se a obrigação do estado em garantir a proteção e a segurança das vítimas de violência doméstica e de género.O sistema de teleassistência a vítimas de violência doméstica tem como objetivo fundamental aumentar a proteção e segurança da vítima garantindo, 24 horas por dia e de forma gratuita, uma resposta adequada a situações de emergência e/ou de crise.
Tem os seguintes objetivos:
a) garantir uma intervenção imediata e adequada em situações de emergência, através de uma equipa especializada e da mobilização de recursos técnicos adequados ao tipo de situação suscitada;
b) mobilizar os recursos policiais proporcionais ao tipo de emergência;
c) atenuar níveis de ansiedade das vítimas, aumentando e reforçando o sentimento de proteção e de segurança;
d) proporcionar apoio e garantir a comunicação 24 horas por dia com um Centro de Atendimento;
e) aumentar a autoestima e a qualidade de vida das vítimas, estimulando a criação e/ou reforço da sua rede social de apoio;
f) minimizar a situação de vulnerabilidade em que as vítimas se encontram, contribuindo para o aumento da sua autonomia e para a sua (re) inserção na sociedade.
O acesso ao sistema de proteção por teleassistência pela vítima de violência doméstica é determinado por decisão judicial, durante a fase de inquérito, com base nos riscos de revitimização e das necessidades específicas de segurança identificadas.
2 – Uma das atividades é a formação para entidades e agentes envolvidos na implementação do sistema de teleassistência, tendo o público-alvo desta formação perfis profissionais diferentes. Considera que existe recetividade destes públicos para a frequência das ações? Em que medida?
São várias as entidades que, no âmbito das suas atribuições legais, estão envolvidas na implementação deste sistema de proteção: desde logo, a Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género (CIG), enquanto entidade coordenadora do sistema; as Magistraturas Judicial e do Ministério Público (que podem decidir sobre a aplicação, manutenção e cessação das medidas de proteção); ambas as Forças de Segurança (GNR e PSP); a Secretaria-geral do Ministério da Administração Interna, enquanto entidade que coordena/acompanha os diversos projetos e iniciativas sobre a violência doméstica que envolvam as Forças de Segurança; as entidades que integram a Rede Nacional de Apoio a Vítimas de Violência Doméstica (Estruturas de atendimento, Respostas de acolhimento de Emergência e Casas de Abrigo) e a entidade contratada para prestar o serviço de atendimento e de geolocalização.
A formação garante que todas as partes envolvidas – com atribuições e perfis tão diversos – partilham a mesma linguagem, as mesmas prioridades, os mesmos conceitos, e que os procedimentos que visam a segurança e a promoção do bem-estar das vítimas são céleres, eficientes e assentes numa intervenção integrada e em rede.
A duplicação e redundância das intervenções aumentam o risco de vitimação secundária ou institucional e descredibilizam o sistema como um todo. Assim, é fundamental que todas as partes tenham um aprofundado conhecimento não só do sistema de proteção (das suas mais-valias e das suas limitações), mas também do papel que cada uma cumpre em todo o processo.
A título de exemplo, a capacitação em avaliação e gestão do risco é absolutamente fulcral para a prevenção da revitimização em geral, e para o sucesso da medida de proteção por teleassistência, em particular.
3 – Pode dar mais alguns exemplos de atividades implementadas com sucesso?
O sistema de proteção por teleassistência recorre a tecnologia adequada, garantindo às vítimas um apoio à distância que assegura uma resposta rápida, 24 horas por dia, 365 dias por ano, às seguintes necessidades: informação, apoio emocional e de proteção policial, quando se justifique.
Para além do atendimento telefónico, o sistema tecnológico possibilita a localização georreferenciada da vítima, fulcral em situações de crise/emergência. Só em 2017 foram decretadas 1060 novas medidas de proteção por teleassistência, o que traduz, sem dúvida, a credibilidade que o sistema tem vindo a ganhar junto das magistraturas, das forças de segurança, das entidades de apoio à vítima e, mais importante, junto das próprias vítimas.
O sistema permite, por exemplo, que a pessoa permaneça na sua área de residência, mantendo o contacto próximo com a sua rede familiar e social, que as suas rotinas prossigam com o mínimo de alterações disruptivas, e com segurança.
Por outro lado, tem permitido, por parte das Forças de Segurança, uma intensificação e otimização das metodologias de policiamento de proximidade, promovendo uma relação mais personalizada e, por conseguinte, mais securizante.
A Rede Nacional de Apoio a Vítimas de Violências Doméstica é, inquestionavelmente, um recurso que, uma vez bem avaliado e gerido o risco, reduz a necessidade (sempre impactante) da institucionalização da pessoa, por exemplo em casa de abrigo.
4 – Quais são os maiores constrangimentos na implementação deste projeto?
A Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género, enquanto entidade pública responsável pela instalação e manutenção do sistema de proteção por teleassistência, tem vindo a trilhar, em estreita colaboração com os restantes parceiros, um percurso exigente e desafiador que advém, sobretudo, do aumento exponencial do número de medidas aplicadas – desde o início do programa, em 2011, e até ao final de 2017, tinham sido determinadas 3 303 medidas de proteção - mas também da dispersão territorial das mesmas, das características dos processos de vitimação e da necessidade, constante, de atualização, comunicação e agilização de procedimentos entre todas as entidades e pessoas envolvidas.
Atualmente, e com a maturação que o sistema já atingiu (muito devido ao trabalho em equipa que as várias entidades têm consolidado), os constrangimentos são essencialmente de ordem instrumental. Ou seja, relacionam-se com aspetos operacionais da sua implementação: diminuição dos tempos entre a decisão judiciária e a efetiva integração da pessoa no sistema de proteção, desburocratização de todo o processo, eliminação de redundância de informação, entre outros.
Outra questão que não deve deixar de ser sublinhada é o risco de uma aplicação massiva desta medida de proteção poder ser entendida como uma desresponsabilização da pessoa agressora, colocando o ónus da proteção na pessoa agredida. A centralidade desta matéria é um dos temas repetidamente abordado quer com as magistraturas, quer com as forças de segurança. Não obstante o histórico e a maturidade que a medida já adquiriu permanecem dúvidas quanto à sua eficiente aplicação e implementação.
5 - Qual o impacto mais desejado com a operacionalização destas atividades junto dos públicos-alvo?
A segurança e o bem-estar das vítimas são os eixos fundamentais desta medida de proteção. Sendo ainda de valorizar que a evolução da medida tem permitido a formação e capacitação dos técnicos, a promoção de intervenções integradas, menos burocráticas e mais eficientes.
6 - Considera haver impactos positivos para a sociedade em geral? Quais?
O combate à violência doméstica é uma prioridade que tem sido desenvolvida em todas as suas dimensões (prevenção primária, capacitação de profissionais, empoderamento das vitimas, responsabilização criminal da pessoa agressora, entre outras).
O atual Plano de Ação para a Prevenção e o Combate à Violência Contra Mulheres e à Violência Doméstica 2018-2021, visa, entre outras medidas, erradicar a tolerância social face às várias manifestações daquela violência, conscientizar sobre os seus impactos e promover uma cultura de não-violência, de direitos humanos, de igualdade e não discriminação.
Paralelamente, pretende ampliar e consolidar a intervenção que tem vindo a ser trilhada nos últimos anos, sobretudo desde que a violência doméstica se tornou crime público (em 2000), qualificando profissionais e serviços para uma melhor intervenção.
A medida de proteção por teleassistência é simultaneamente instrumental, no sentido em que se trata de um recurso objetivo, eficiente e disseminado em todo o território nacional, e paradigmático do esforço que o Estado Português tem feito na procura de soluções, modernizadas, de segurança, proteção e promoção do bem-estar. Visa prioritariamente os níveis de proteção e segurança das vítimas de violência doméstica, prevenindo situações de revitimação, isolamento social e, por conseguinte, aumentar a qualidade de vida dessa população.